Muitos pais já descobriram
que a paternidade vai além de desempenhar apenas o papel de provedor. Entenda
como a participação paterna pode trazer resultados positivos na vida da
criança, da família e do próprio homem.
Pais rígidos, de poucas
palavras e sem participação na rotina dos filhos. Durante muitas décadas, esse
foi o modelo mais conhecido de pai. Enquanto eles trabalhavam fora, as mães
ficavam com a tarefa de orientar as crianças. Talvez por isso muitas pessoas
ainda acreditem que a mãe é culpada quando algo dá errado na educação de um
filho. Mas e o pai? Qual é o papel dele na vida dos filhos? Apesar da existência dessas
crenças antigas, boa parte da sociedade brasileira reconhece a importância de
pais mais participativos. Prova recente disso é a lei que aumenta a
licença-paternidade de cinco para 20 dias (saiba mais na página 2). Nas ruas,
parques e reuniões familiares, é possível observar novas atitudes em muitos
pais, que agora conversam, alimentam e também trocam fraldas. “Ainda existe essa ideia de
que o pai é coadjuvante na vida do filho, mas, na verdade, ele é protagonista
junto com a mãe. Ele é importante no desenvolvimento cognitivo e afetivo da
criança”, destaca o psicólogo e professor universitário Breno Rosostolato, que
atua em São Paulo. Para ele, o aumento da
licença-paternidade é um grande passo. “O contato do pai com o recém-nascido é
primordial não apenas pelos cuidados que a criança demanda, mas para que a mãe
se sinta apoiada e a família fique ainda mais unida”, esclarece.
Bom
para todos
Nos Estados Unidos, uma
associação descobriu que a falta do pai provoca graves prejuízos para a
criança, para a sociedade e também para ele mesmo. A ausência da figura paterna
está fortemente ligada a fatores como gravidez na adolescência, delinquência juvenil,
abuso, suicídio, drogas e consumo de álcool, segundo pesquisas da Iniciativa
Nacional da Paternidade (tradução livre de National Fatherhood Initiative –
NFI). Crianças que crescem sem o pai são quatro vezes mais propensas a viver na
pobreza. Já a relação positiva com os
filhos motiva os pais a levar uma vida melhor, até quando as circunstâncias são
difíceis. Pais encarcerados que escrevem a seus filhos uma vez por semana
melhoram suas chances de encontrar emprego e de se reinserir na sociedade.
Como começar?
Os palestrantes e escritores
Renato e Cristiane Cardoso lembram que os pais não podem perder a autoridade na
relação com os filhos. Para isso, deve-se evitar bate-bocas. “Se a criança tem
que ir para a cama às 9 da noite, não discuta com ela sobre isso. Resuma-se a
dar-lhe uma razão que ela possa entender”, escreve Renato em seu blog. Ele
ainda defende que os pais precisam orientar os filhos a resolver problemas
desde a primeira infância. “Os pais devem ensinar os filhos a pensar.” Cristiane acrescenta que os
pais não devem se deixar levar pelas emoções dos filhos. “Às vezes o filho
chega chateado, bate a porta, você vai falar com ele e ele grita. Em vez de
gritar também ou criticá-lo, mantenha o controle. Você não precisa entrar no
mesmo humor do seu filho ou filha. Talvez você tenha que deixar passar um
tempinho para perguntar o que aconteceu.” O casal ministra a palestra
“Transformação Total de Pais & Filhos”, aos domingos, às 18h, no Templo de
Salomão, em São Paulo. A psicopedagoga e especialista
em desenvolvimento infantil Sheila Leal diz que muitos pais têm dificuldade
para interagir com os filhos. “Muitos não conseguem conversar ou brincar com os
filhos, eles acham que não é necessário. O pai precisa mostrar que é amigo
porque ele ajuda a formar o caráter do filho”, avalia. Até os homens que tiveram
pais ausentes ou muito autoritários podem descobrir uma boa forma de educar
seus filhos, equilibrando parceria e limites. “Com a paternidade, os homens
aprendem a ser um pouco mais flexíveis. Eles observam como foi antes e não
querem que algumas coisas se repitam”, resume Sheila, que é criadora do projeto
Filhos Brilhantes, em Campinas (SP). A participação do pai também
ajuda no desempenho escolar dos pequenos, segundo Inajara Simões, orientadora
educacional de Ensino Infantil da Escola do Futuro, em São Paulo. Entre os
reflexos positivos estão autoconfiança, criatividade, autoestima e preparo para
resolução de conflitos. “O acompanhamento da rotina escolar deve ser
equilibrado e ter como objetivo dar segurança para as crianças, incentivando-as
a conquistarem mais autonomia.”
Pai Atento
Os filhos do gerente
informativo Pericles dos Santos Pellegrini Filho, de 54 anos, (foto ao
lado) já estão crescidos. O primogênito,
Pericles, tem 30 anos, e o caçula, Erick, 28 anos. Apesar disso, o pai diz que
não deixa de se preocupar com a prole. “Eles já estão formados, mas ainda fico
de olho, quero participar, saber o que eles estão fazendo. Estamos sempre
próximos, conversamos por telefone, acompanho o que eles fazem nas redes
sociais. Quero que eles estejam sempre felizes”, diz. Pericles conta que os filhos
o levaram a repensar as próprias atitudes. “Com os filhos, nós queremos ser
melhores para ensiná-los a ser pessoas melhores também. Eles trazem a necessidade
do pai se corrigir. Quem não quer ser melhor para ser um bom exemplo aos
filhos?”, indaga. Pericles explica que ainda se surpreende ao observar as
semelhanças entre os filhos e ele. “É curioso quando percebo que até o modo
como eles se coçam é igual ao meu. Eu me reconheço neles, eles são parte de
mim”, conclui.
Pai em tempo integral
A vida de Reinaldo Rodrigues
da Silva, de 41 anos, (primeira foto da matéria) mudou com a chegada da filha Alice. Por causa
de um acidente de carro, a esposa dele, Paula, teve uma gravidez de risco e
precisava repousar. Quando a menina nasceu, a mãe ainda enfrentava algumas
limitações. Reinaldo, então, saiu do emprego para cuidar da filha. “Ficava meio
atrapalhado no começo. Na hora do banho, ficava preocupado de deixar a Alice
cair, mas depois peguei o jeito. Aprendi a trocar fraldas e alimentá-la.” A família
vive em Lagoa Nova (RN). Aos poucos, Reinaldo
aprendeu a cozinhar, organizar a casa e lavar roupa. Ele passou a fazer várias
atividades com a menina, que hoje tem 9 anos. “Voltei a ser criança. Brinco de
casinha, ajudo na lição de casa. Conversamos bastante e lemos juntos. Somos
amigos, eu a levo à escola, ao balé, à natação, à igreja, às aulas de violão”,
explica. Reinaldo conta que é um
privilégio participar da rotina da filha. “Sempre procurei ser um pai presente.
Perdi meu pai num acidente de carro quando tinha 8 anos, sei o que é viver sem
pai. É muito gratificante ter o tempo necessário para cuidar dela.” Segundo
ele, a proximidade com Alice ajuda no fortalecimento dos valores da família.
“Nós nos respeitamos muito. Alice é uma menina calma e observadora”,
derrete-se.
Parceria e disciplina
O repórter cinematográfico
Flávio Fernandes, de 43 anos, sempre participou ativamente da rotina dos filhos
Leonardo, de 19 anos, (foto ao lado) e Flávia Gabriele, de 13 anos. “Temos
diálogo e união. Conversamos e fazemos muitas atividades juntos. Eles me
procuram para tirar dúvidas e pedir opiniões.” Leonardo confirma. “Não faço
nada sem consultar meu pai. Ele é aquela pessoa que eu posso contar”, diz o
jovem, que é estudante de Direito.
Flávio explica que aprendeu
a ser pai analisando as próprias experiências. “Eu não passo para eles só o que
vivi com meu pai. Uso o que aprendo no dia a dia e tento corrigir alguns erros
do passado.” O pai de Flávio, por exemplo, não o deixava andar de bicicleta
durante a infância. “Andei escondido até os 13 anos. Já o Leonardo aprendeu a
andar de bicicleta aos 3 anos. Colocamos joelheira, cotoveleira e ele foi.
Levou alguns tombos, mas aprendeu rápido”, brinca. “Ainda me lembro de um dia
em que ele me levou ao ginásio e andei de bicicleta o dia inteiro, cai, ralei o
joelho, mas gostei muito”, explica Leonardo. Flávio diz que não abre mão
da disciplina. “É importante ser amigo, parceiro, apoiar e orientar, mas não
podemos deixar os filhos fazer tudo o que querem. Às vezes, o ‘não’ é a melhor
escolha.” Ele garante que se transformou com a chegada dos filhos. “Eles
preencheram o que faltava em mim. Sou muito feliz. É claro que tem preocupação,
mas são muitos momentos de alegria”, afirma, acrescentando a importância da
parceria com a esposa, Andrea, de 41 anos.
Educar por exemplo
Para o bispo Antonio Melo,
ser pai é “uma bênção de Deus”. Entretanto, ele destaca que a paternidade exige
responsabilidade e maturidade. “Ser pai requer muita atenção e dedicação. Não
adianta querer educar com a força do braço, a melhor coisa é ser exemplo.” Ele
pondera que até mesmo os pais mais preparados correm o risco de se decepcionar
“por causa dos rumos da sociedade”. Pai de Priscila Machado, de 22 anos, o
bispo destaca a força e a determinação da filha. “Vencemos muitas lutas e
batalhas”, explica. “Vejo a Priscila como um presente de Deus. Hoje ela é
casada e um exemplo para mim.”
Publicado em 01/05/2016 às 00:05. Por Rê Campbell
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